sexta-feira, 19 de janeiro de 2018

[Resenha] Carrie, a Estranha

“Wish I could write you a melody do plain; That would save you, dear lady, from going insane; That would ease you and cool you and cease the pain; Of you useless and pointless knowledge…” (Página 198)


“Carrie, a Estranha” ao contrário do que muitas pessoas possam pensar, não foi o primeiro livro escrito por Stephen King, mas foi o livro que marcou o início da sua carreira, iniciada no ano de 1975.

Com uma narrativa que mistura bullying extremo, crueldade, omissão, fanatismo religioso e vingança, “Carrie, a Estranha” é um livro que vai muito além do terror clássico de “cabeças sendo decepadas”, e assombra o leitor ao entregar uma obra aterrorizante e desesperadora - da qual reflete, em um certo grau, nós mesmos - em que fica evidente a solidão de uma garota que teve o azar de nascer no lugar errado.

“Depois de duzentas mortes e da destruição de uma cidade inteira, é fácil esquecer uma coisa: éramos crianças. Éramos crianças. Éramos crianças com a melhor das intenções…” (Página 70)

Apesar da forma com que o livro é vendido, sendo apenas uma história de terror e vingança, “Carrie, a Estranha” passa longe de ser uma obra rasa e levanta questionamentos muito sérios e atitudes que até hoje são perpetuadas.


Carrie é alguém que sofreu desde a primeira divisão celular, já que sua mãe Margareth a têm como um pecado - apesar de ter sido concebida com consentimento. Carrie é uma verdadeira vítima, que foi submetida a anos incansáveis de abuso e descriminação que culminam com um banho de sangue que só pode ser tratado como vingança “divina”, ou será que Carrie realmente é a única culpada dessa situação?

Ela luta contra o desejo de ser uma menina normal e o medo da mãe abusiva. Carrie só quer aceita, ela só quer pertencer a algum lugar sem que todos a repudiem ou ignorem. Porém, devido a esse medo constante da mãe, ela nunca fez nada para melhorar sua situação.  

Após um evento traumático (que só pode ser chamado de bullying extremo), ela redescobre seus dons telecinéticos. O que é o estopim para a sua libertação.


O que mais me fez pensar neste livro foi a magnitude dos atos da cidade maldita de Carrie. Até onde a crueldade e a omissão das pessoas podem chegar? Quão cruéis elas podem ser? Uma garota inocente passa pelos noves círculos do inferno todos os dias e ainda é tratada como o grande “problema”, quando é evidente que a raiz do problema é bem maior.

Aqui acontece o clássico caso de uma vítima que leva a culpa. Claro, nada é tão simples ao achar que Carrie realmente não teve sua parcela de culpa, afinal ela fez o que fez. Os moradores da cidade arrancaram o último pingo de sanidade de Carrie, ela atinge o fundo do poço e explode. Ela sofria abusos todos os dias sendo que ninguém nunca lhe estendeu a mão ou foi bondoso com ela. Será que o que aconteceu a cidade não foi uma forma nefasta de justiça?

King permite reflexões sobre como a ausência de atitudes, o fato de não se tomar partido, é tomar partido... Ficar em cima do muro, ou virar as costas é apoiar quem está praticando o bullying.


Este livro choca, da raiva, e no final, depois de tanto sofrimento, o sentimento que perpetua é a tristeza ao ver quão sozinha Carrie estava até o fim. Deprime ver que ela é tida como monstro em uma situação tão complicada e que envolvia o desprezo e o ódio de tantas pessoas. Será que se alguém tivesse se convalescido a situação e ficado do lado de Carrie as coisas não teriam sido extremamente diferentes?

Em linhas gerais, “Carrie, a Estranha” é um livro muito mais profundo do que aparenta ser, e garante despertar aquela dúvida em nossas mentes: será que já fizemos mal a uma pessoa? Será que já não fingimos não ver algo para não ter que ajudar alguém que realmente precisava no momento? Me atrevo a dizer que a resposta a essas perguntas será, sim. Boa sorte encostando a cabeça no travesseiro agora e tendo bons sonhos...

Autor: Stephen King
Editora: Suma de Letras
Número de páginas: 200
Classificação: ★★★★/✰✰✰✰✰

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