sexta-feira, 2 de fevereiro de 2018

[Resenha] Mar Despedaçado #2: Meio Mundo

“Enquanto viver, o que você pode ser está nas suas mãos, em primeiro lugar.” (Página 31)


O que pode ter faltado em “Meio Rei” do autor Joe Abercrombie? Se você pensou em ainda mais representatividade, figuras do passado, protagonistas fodas e fuga de clichês você acertou!

No segundo volume da trilogia “Mar Despedaçado” temos um Yarvi que no lugar de meio rei, é chamado por Pai Yarvi. Dois anos se passaram desde os eventos de “Meio Mundo” e ele finalmente ocupou seu lugar de direito e se tornou ministro do rei Uthil, o grande governante de direito de Gettland.

Porém, nem tudo são rosas e uma guerra contra o Rei Supremo ecoa pelos mares. Gettland precisa urgentemente de aliados. Só que arranjar aliados não será uma tarefa simples, ainda mais considerando o histórico de luta e sangue dos países que os rodeiam. Cabe a Yarvi e uma tripulação de desajustados, navegar por meio mundo (sim, eu disse o nome do livro!) em busca de aliados/inimigos. Afinal, o inimigo do meu inimigo é meu amigo. 

Você pensa que apenas isso fecha “Meio Mundo”? Nada disso amiguinho. Este livro é muito mais completo do que a preparação para uma guerra - pois é, vai vendo o tamanho da merda que eles precisam resolver (sempre mantendo o bom humor, claro)...

“Pela luz que ela projeta na vida de todo mundo, parece que a Mãe Sol se enfiou no cu daquela mulher.” (Página 207)


“Meio Mundo” foi uma surpresa incalculável. Um dos únicos pontos que eu tinha sentido relativa falta em “Meio Rei” eram mais personagens femininas que interagissem, e aqui temos duas personagens, fora as que apareceram no volume anterior, que superaram todas as expectativas.

Uma delas é Thorn Bathu, uma aprendiz de guerreira de 15 anos que quer provar para todos que uma mulher é tão capaz, se não mais, quanto qualquer homem. Thorn é completamente arrogante, ansiosa e tocada pela Mãe Guerra - leia-se com fogo nuzóio. Mesmo possuindo talento para o combate, ela está longe de poder ser considerada uma guerreira de verdade. 

“[...] Lutava contra o mundo havia tanto tempo que nem conseguia se lembrar. Thorn era uma guerreira; daria a eles uma luta que jamais esqueceriam.” (Página 14)

Apesar de seus defeitos, ela apresenta enorme coragem ao seguir os passos do pai e treinar extensivamente para se tornar uma guerreira, enfrentando o seu maior inimigo: o machismo. Mesmo ela se destacando como uma das melhores de sua classe, seu treinador nunca reconhece sua habilidade, a ridiculariza e se recusa a permitir que ela se forme. Em uma teste extremamente covarde e injusto, que termina em tragédia, Thorn é sentenciada à morte.

“Todas essas eram notícias de heroísmo, como que saídas das canções, e não há nada melhor que o sucesso dos outros para fazer com que nossos fracassos sejam mais dolorosos ainda.” (Página 65)

“Meio Mundo” trata de uma jornada épica em que um grupo completamente heterogêneo que cruza os mares em busca de ajuda. Apesar da premissa relativamente simples, Abercrombie recheia o livro com culturas diferentes que ameaçam essa viagem, ao mesmo tempo que aumenta a tensão a cada página.

“[...] A vingança só anda em círculos. Ela parte do sangue e volta ao sangue. A Morte espera por todos nós. Você pode seguir seu caminho curvada sob um fardo de raiva. Eu fiz isso durante muitos anos. Você pode deixar que a raiva a envenene [...] Ou pode deixar para lá. Fique bem, Thorn Bathu.” (Página 263)


Assim como em “Meio Rei”, é impossível não se sentir parte da tripulação e se afeiçoar a cada um dos personagens. Terminar este livro significa dizer adeus a amigos que estiveram do seu lado durante semanas, e isso deixa um gostinho amargo na boca.

Um dos pontos mais interessantes na prosa de Abercrombie é a capacidade que ele tem de criar personagens imperfeitos. Yarvi e Thorn não podiam ser mais diferentes, porém, ambos começam suas respectivas jornadas como crianças ingênuas e cheias de si, só para descobrirem o quão insignificantes são ao perderem tudo que haviam conquistado. A sua jornada de reconstrução e superação é o que dá o tom a obra. A forma com que Abercrombie expõe seus maiores defeitos, e faz com que eles amadureçam e superem cada um deles, se tornando pessoas excepcionais, é uma das coisas que eu mais gosto na escrita do autor.

“Postar-se? - Os olhos de Skifr se arregalaram - Você é uma matadora, garota! Você é a tempestade, sempre em movimento! Você corre para encontrar o inimigo ou o engana para que ele vá ao seu encontro e, no terreno que escolher, do jeito que escolher, você o mata.” (Página 95) 

Seus personagens não são grandes apanhados de clichês. Eles são únicos e reais. Apesar de ser uma coisa relativamente idiota - sendo otimista, claro - eu amei como Abercrombie não estereotipou Thorn, descrevendo-a como sensual e delicada. Thorn é uma guerreira selvagem e extremamente letal, por isso ela apresenta características de uma verdadeira guerreira - e graças a Deusa ela não se importa mais com vestidos do que com seu treinamento. BEIJOS CELAENA!

Apesar da sua força e determinação, em seu âmago ela luta uma batalha diária contra seus conflitos e medos. E mesmo não demonstrando, continua sendo atormentada pela sombra do fracasso e menosprezo. 


“Admiro você, de verdade [...] Mas, quando a Mãe Guerra abrir as asas, ela pode lançar todo o Mar Despedaçado nas sombras.” (Página 363)

A imprevisibilidade do volume final da trilogia, “Meia Guerra”, é o que mais me assusta e anima. Qualquer coisa pode acontecer e ninguém está à salvo das garras Mãe Guerra. Basta esperarmos que tudo seja parte do grande plano de Pai Yarvi, ou cabeças vão rolar…

“Quando algo precisa ser feito, não há nada a ganhar com o adiamento, a não ser dor.” (Página 264)

Autor: Joe Abercrombie
Editora: Arqueiro
Número de páginas: 368
Classificação: ★★★★★♥/✰✰✰✰✰

*Livro cedido em parceria pela editora*

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